Hoje fui a uma sessão de poesia da Comuna, com poemas relacionados com o 25 de Abril. Foi lindíssimo.
A certa altura comecei a achar que não devia ter ido. A certa altura assaltou-me o sentimento - que tenho muitas vezes em situações do género - que há coisas que começam a parecer um arquivo. Esta é uma delas.
Ouço os poemas e as variações. Sente-se a revolta contra um país amorfo, triste e pobre (antes da revolução), sente-se a euforia da revolução, o poema da Sophia sobre "o dia inicial, inteiro e limpo", e o "tudo o que temos pra nos dar" do José Mário Branco.
E que foi isso?
A geração que fez o 25 de Abril (e, de certa forma, que inveja eu tenho dela por ter podido viver aquilo) sonha e revive a emoção que deve ter sido.
Mas e eu?
Eu olho à volta e Abril está todo por cumprir.
Olho em volta e quem vejo (em lugares que se vêem) são cinzentos "extremistas de centro" (como parodiavam os Gato Fedorento), e toda a gente continua mais ou menos amorfa, mais ou menos cinzenta, a ignorar que Abril alguma vez existiu.
Escrevo isto auto-recriminando-me por uma certa injustiça e ingratidão. Não acuso ninguém. Não houvesse ninguém mais e eu continuaria a sentir isto, sentir que ver as coisas como arquivo não faz justiça a quem as fez, não faz justiça àquilo que se queria que tivessem sido.
Abril continua praticamente todo por cumprir, e ainda bem que a sessão de poesia só aflorou ao de leve o sentimento de frustração que se sentiu logo a seguir. De ter tido a liberdade, o sonho nas mãos e os ter deixado escapar.
Eu ainda gostava de saber onde é que ele está.
(Ponderei antes de escrever, de publicar. Não quero ofender ninguém (muito menos uma amiga de quem gosto muito, e que se pode sentir visada, mas sem razão), mas não posso calar se é isto que sinto.)
quinta-feira, maio 24, 2007
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2 comentários:
Sinto o mesmo que tu. Mas continuo a achar que as revoluções já não se fazem nas ruas. Há que mudar maneiras de pensar e por cada pessoa que conseguimos converter ao modo certo de estar e ser estamos a cumprir um bocado da nossa parte.
Belo texto!!!
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